1.1. Ele não é preexistente
Diferente do Deus eterno e autoexistente, sem princípio ou fim de dias (Sl 90.2), o ser humano possui um ponto de origem determinado pelo Ato Criador. Isso significa que ele não existia antes de ser formado. Ele foi criado no tempo e inserido na História; por isso, não pode ser confundido com qualquer divindade nem possuir atributos divinos em sua origem.
A crença na preexistência da alma - segundo a qual ela (a alma) já existia antes do nascimento físico da criatura humana - está presente em algumas correntes filosóficas, como o platonismo, e em religiões orientais, como o hinduísmo. Essas ideias sustentam que o ser humano reencarna sucessivamente, acumulando experiências rumo à elevação espiritual. No entanto, essa visão contraria o ensino claro das Escrituras: Adão passou a existir quando Deus o formou do pó da terra e lhe soprou o fôlego da vida (Gn 2.7).
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MUITO ALÉM DA BIOLOGIA
- Mais do que corpo e razão, o Homem é portador da imagem de Deus. Sua existência carrega propósito e revela que sua origem está no alto, não nos processos da natureza. A Bíblia não o apresenta como um espírito em trânsito, mas como uma criação intencional e única, surgida no tempo e com destino eterno. Ele pensa, sente, escolhe e adora.
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1.2. Ele não é uma derivação da essência de Deus
A afirmação de que o Homem foi criado à imagem e semelhança de Deus (Gn 1.26-27) não implica que ele participe da essência divina. Trata-se de uma semelhança funcional e relacional, refletida em atributos comunicáveis, como racionalidade, moralidade e espiritualidade (cf. Tópico 3). Contudo, o ser humano permanece distinto em natureza, não compartilhando Seus atributos incomunicáveis, como onisciência, onipresença e onipotência. Identificá-lo como uma extensão da Divindade é adotar uma concepção panteísta - perspectiva filosófico-religiosa segundo a qual Deus e o Universo são idênticos ("Deus é tudo e tudo é Deus"), diluindo a distinção entre Criador e criatura. Tal concepção é incompatível com a teologia bíblica, que afirma a transcendência do Eterno (Is 55.8-9; 1 Rs 8.27) e a contingência da Criação (Gn 1.1; Hb 11.3).
1.3. Ele não é a expressão física do Eterno
Alguns escritores sagrados utilizaram termos como mãos (Ex 15.12), olhos (2 Cr 16.9), braços (Dt 33.27) e olhos e ouvidos (Sl 34.15) para fazer referência às manifestações do Altíssimo na história bíblica. Tais descrições devem ser interpretadas como antropomorfismos teológicos - recursos linguísticos por meio dos quais os atributos e ações divinas são comunicados em termos humanos, a fim de tornar a revelação compreensível à nossa mente limitada.
Contudo, é necessário afirmar com clareza que Deus é espírito (Jo 4.24) e, portanto, não possui corporeidade física. Atribuir ao Criador uma forma humana literal é reduzir Sua natureza ao plano material, algo incompatível com a revelação Escritura, que o descreve como invisível, eterno e exaltado acima de toda a Criação (1 Tm 1.17).
1.4. Ele não é resultado de um processo evolutivo
A teoria da evolução das espécies, popularizada por Charles Darwin em sua obra A origem das espécies (1859), propõe que a diversidade da vida surgiu por meio de um processo gradual de seleção natural. Darwin observou a fauna e a flora em diferentes regiões, especialmente nas Ilhas Galápagos - situadas no Oceano Pacífico, próximas à costa da América do Sul -, e formulou suas ideias com base nas variações entre os organismos observados.
Embora amplamente difundida no meio acadêmico, a teoria evolutiva permanece sendo objeto de pesados debates e densos questionamentos - especialmente no que se refere à origem, consciência moral e espiritualidade do ser humano.
Essa articulação conceitual não explica aspectos profundos de nossa natureza, como a sede por transcendência, a racionalidade complexa, a noção de eternidade (Ec 3.11) e o senso moral inscrito em nossa consciência.
De acordo com a Palavra sagrada, o Homem não é resultado de um processo aleatório e impessoal, mas fruto de um Ato Criador intencional (Gn 1.27, 2.7). A fé cristã não nega a observação do cosmos, mas afirma que a origem e o destino da humanidade ultrapassam as explicações naturalistas. A verdade revelada em Gênesis continua sendo o fundamento seguro da nossa esperança. No princípio, criou Deus os céus e a terra. (Gn 1.1 - grifo nosso.)
2. COMO O HOMEM FOI CRIADO
A afirmação de que o Homem foi criado por Deus, à Sua imagem e semelhança, é um dos pilares fundamentais do testemunho das Escrituras. Em contraste com as múltiplas tentativas reducionistas de explicar sua origem com base apenas em processos naturais ou construções filosóficas, a cosmovisão bíblica sustenta que o surgimento do homem na Terra está diretamente ligado à vontade soberana, ao propósito eterno e ao poder do Altíssimo.
2.1. Criado de forma direta e intencional
Entre os teólogos cristãos, destacam-se duas principais interpretações quanto à criação do ser humano. A perspectiva mediata propõe que ele foi formado pelo Eterno por meio de um processo progressivo, ao longo do tempo. Já a visão imediata sustenta que sua constituição se deu de forma direta, completa e definitiva, tal como o conhecemos hoje.
Ainda que ambas as visões busquem honrar a ação divina, a narrativa bíblica enfatiza que o Homem não surgiu de forças naturais nem de processos evolutivos. Não há evidências que tenha vindo das valências da matéria. Pelo contrário, tudo aponta para sua origem sobrenatural.
2.1.1. A linguagem bíblica da criação intencional
A criatura humana foi formada de maneira intencional e direta. Em Gênesis 1.27, o verbo hebraico bārā' ("criar") indica um ato exclusivo do Criador ao chamar à existência algo absolutamente novo.
Em Gênesis 2.7, o escritor sagrado emprega o verbo yāṣar ("modelar", "moldar"), revelando o cuidado e a proximidade do Senhor na formação do homem a partir do pó da terra. A maneira como o texto apresenta essa criação é distinta da dos demais elementos da natureza: aqui, Deus se envolve diretamente, formando-o com as próprias mãos e soprando nele o fôlego da vida (Gn 2.7).
2.2. Criado com identidade, dignidade e missão
A doutrina bíblica da Criação não tem por objetivo fixar datas, mas revelar a intencionalidade divina. Genealogias, como as de Gênesis, visam a apontar a linhagem messiânica (cf. Gn 5; 10), não a estabelecer cronologias absolutas. Mais importante que saber quando a humanidade foi criada é compreender por que e para quem foi criada.
Diferente das teorias naturalistas, que reduzem o homem a um animal racional aperfeiçoado, o texto sagrado o apresenta como único ser feito à imagem e semelhança de Deus (Gn 1.26-27), com capacidade de se relacionar com Ele, refletir Seus atributos e exercer domínio responsável sobre a ordem criada (Gn 1.28-30). Essa distinção lhe confere honra, consciência moral e vocação espiritual.
Chamado à existência para viver em comunhão com o Altíssimo e manifestar Sua glória no mundo, o ser humano só encontra sentido quando reconhece a origem desse chamado e a ele responde com inteireza. Nesse sentido à doutrina da Criação não constitui um elemento periférico da fé cristã, mas o alicerce a partir do qual se entende a Queda, a redenção e o destino eterno da humanidade.
3. CARACTERÍSTICAS DO SER CRIADO À IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS
Criados à imagem e semelhança de Deus (Gn 1.26-27), homens e mulheres carregam em si Seus atributos comunicáveis. Isso não significa que os distinguem de todos os demais seres criados. Essas características apontam para seu chamado original: refletir Sua glória, relacionar-se com Ele e com o próximo, exercer administração sobre a Criação e viver em santidade.
A seguir, são apresentadas seis dessas características:
3.1. Personalidade e racionalidade
Deus é um ser pessoal e relacional (1 Jo 4.8). Criado à Sua imagem e semelhança, o ser humano possui também uma personalidade, isto é, consciência de si, vontade, emoções e a capacidade de comunicar-se e construir vínculos significativos.
Essa dimensão fundamenta sua responsabilidade moral. Entre os elementos que a compõem, destaca-se a racionalidade (Cl 3.10; Pv 1.7) - expressão da interioridade que possibilita compreender, interpretar e transformar a realidade. Tal faculdade reflete a mente do Criador e impulsiona o desenvolvimento das artes, das ciências e da cultura.
3.2. Moralidade e espiritualidade
Por serem dotados de consciência moral, homens e mulheres possuem um senso inato do certo e do errado, do justo e do injusto, sendo responsáveis por suas escolhas e julgados por elas (Rm 2.14-16). Essa sensibilidade ética os distingue dos demais seres vivos e os torna passíveis de arrependimento, perdão e reconciliação.
Essa dimensão, orientada para o bem e a verdade, conecta-se à espiritualidade - a capacidade de se relacionar com Deus e perceber realidades que transcendem o visível. Criado para a comunhão com o Divino, o ser humano adora, busca sentido e se eleva além da matéria. Essa espiritualidade não se reduz a ritos; é um vínculo vivo com o Criador (Jo 4.24).
3.3. Sociabilidade e infinitude
Não é bom que o homem esteja só (Gn 2.18) - essa afirmação revela que a convivência está no cerne da intenção divina para a humanidade. Fomos criados para viver em comunhão: com a família, a comunidade de fé e a sociedade. O isolamento prolongado compromete nossa realização plena e fere a vocação relacional inscrita por Deus em nossa constituição.
A sociabilidade não é apenas uma necessidade circunstancial, é um anseio por permanência: quem ama deseja continuar amando, e todo vínculo verdadeiro aspira perdurar. Esse impulso revela o eco da Eternidade que Deus plantou no coração humano (Ec 3.11). Fomos criados não somente para vínculos passageiros, mas para a comunhão eterna - com o Criador e com o próximo.
Embora tenhamos um, e nosso destino eterno depende da resposta dada à revelação divina. Essas marcas evidenciam não exclusivamente honra, mas o chamado supremo da humanidade: refletir a imagem do Criador e viver para a Sua glória.
CONCLUSÃO
O Homem não veio do caos nem do acaso. Veio do amor, do barro e do sopro. Veio do alto. Relembrar essa realidade nos devolve o chão - e o céu. Somos a imagem de Deus em carne, alma e espírito. Somos criação com propósito, gente com destino.
Que esta lição desperte em nós não só o entendimento, mas a reverência.
Que ao olhar para si, cada um perceba o toque do Criador, e ao olhar para o outro, reconheça a dignidade de quem também carrega, ainda que ofuscada, a imagem do Eterno.
ATIVIDADE PARA FIXAÇÃO
1. Segundo a Escritura, em que aspectos o Homem se distingue das demais criaturas?
R.: Na personalidade, racionalidade, moralidade, espiritualidade, sociabilidade e infinitude.
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